Por
Silvio Dutra
“13 Atendei,
agora, vós que dizeis: Hoje ou amanhã, iremos para a cidade tal,
e lá passaremos um ano, e negociaremos, e teremos lucros.
14 Vós não sabeis o
que sucederá amanhã. Que é a vossa vida? Sois, apenas, como neblina que aparece
por instante e logo se dissipa.
15 Em vez
disso, devíeis dizer: Se o Senhor quiser, não só viveremos, como também faremos
isto ou aquilo.
16 Agora,
entretanto, vos jactais das vossas arrogantes pretensões. Toda jactância
semelhante a essa é maligna.
17 Portanto,
aquele que sabe que deve fazer o bem e não o faz nisso está pecando.”
(Tiago 4.13-17)
Uma das expressões mais usadas para expressar a
expectativa quanto à realização de projetos futuros é: “se Deus quiser”,
faremos, iremos, teremos etc. Todavia, o que menos é considerado por aqueles
que assim se expressam, é qual seja de fato a vontade de Deus para suas vidas.
As palavras do apóstolo Tiago, em nosso texto, foram escritas por ele em
um contexto de exortação ao exercício da fé, sobretudo nas tentações e
provações, objetivando-se alcançar um procedimento paciente que glorifique a
Deus.
É neste contexto que devemos então buscar entender qual foi o
significado principal pretendido por ele ao dizer: “Se o Senhor quiser, não só
viveremos, como também faremos isto ou aquilo.”
Ele aponta a brevidade da nossa vida neste mundo, e a nossa incompleta
suficiência própria para viver de modo agradável a Deus, de modo que somos inteiramente
dependentes não apenas da vontade de Deus para sermos ajudados em nossas
tribulações, como também quanto a sermos convocados ou não por Ele a passarmos
por elas.
Se ficássemos sempre à mercê de nossas próprias possibilidades e
capacidades, ficando fora da esfera de proteção divina, de há muito seríamos
destruídos pelos poderes das trevas, cujo ministério é o de matar, roubar e
destruir, pois é somente nisto que Satanás e os demônios se aplicam.
Se para propósitos específicos, sobretudo de prover crescimento
espiritual aos crentes, Deus pode reter a ajuda da graça em determinada
ocasião, para que aprendam a exercitar a fé contra os poderes malignos que os
atacarão, e que não há neles próprios qualquer força ou capacidade para
vencê-los, pois isto é feito somente por Jesus.
O apóstolo Paulo aprendeu isto na experiência do espinho na carne:
“2 Conheço um homem
em Cristo que, há catorze anos, foi arrebatado até ao
terceiro céu (se no corpo ou fora do corpo, não sei, Deus o sabe)
3 e sei que
o tal homem (se no corpo ou fora do corpo, não sei, Deus o sabe)
4 foi
arrebatado ao paraíso e ouviu palavras inefáveis, as
quais não é lícito ao homem referir.
5 De tal
coisa me gloriarei; não, porém, de mim mesmo, salvo nas
minhas fraquezas.
6 Pois, se
eu vier a gloriar-me, não serei néscio, porque direi a
verdade; mas abstenho-me para que ninguém se preocupe comigo mais
do que em mim vê ou de mim ouve.
7 E, para
que não me ensoberbecesse com a grandeza das revelações, foi-me
posto um espinho na carne, mensageiro de Satanás, para me esbofetear, a fim de
que não me exalte.
8 Por causa
disto, três vezes pedi ao Senhor que o afastasse de mim.
9 Então, ele me
disse: A minha graça te basta, porque o poder se aperfeiçoa na
fraqueza. De boa vontade, pois, mais me gloriarei nas fraquezas, para que sobre
mim repouse o poder de Cristo.
10 Pelo que
sinto prazer nas fraquezas, nas injúrias, nas necessidades, nas
perseguições, nas angústias, por amor de Cristo. Porque, quando sou
fraco, então, é que sou forte.” (II Coríntios 12.2-10).
Paulo aprendeu tanto esta lição que nós o vemos dizendo:
“Pela graça sou o que sou” (I Cor 15.20).
Ele sabia que havia oposições a serem vencidas na obra do evangelho, e
por isso sempre pedia à Igreja que orasse por ele.
“17 Tomai também o
capacete da salvação e a espada do Espírito, que é a palavra
de Deus;
18 com toda
oração e súplica, orando em todo tempo no Espírito e para isto vigiando
com toda perseverança e súplica por todos os santos
19 e também por mim;
para que me seja dada, no abrir da minha boca, a palavra, para, com intrepidez,
fazer conhecido o mistério do evangelho,
20 pelo qual
sou embaixador em cadeias, para que, em Cristo, eu seja ousado para falar, como
me cumpre fazê-lo.” (Efésios 6.17-20).
“2 Perseverai
na oração, vigiando com ações de graças.
3 Suplicai,
ao mesmo tempo, também por nós, para que Deus nos abra
porta à palavra, a fim de falarmos do mistério de Cristo, pelo qual
também estou algemado;” (Colossenses 4.2,3).
“8 Ficarei,
porém, em Éfeso até ao Pentecostes;
9 porque uma
porta grande e oportuna para o trabalho se me abriu; e há muitos adversários.”
(I Coríntios 16.8,9).
Uma vez que somos confirmados na fé, e avançamos em graus na
santificação, a tendência é a de que a luta que temos com o nosso próprio ego
carnal, torna-se muito menor em razão da nossa permanente comunhão com o
Senhor. Mas, a luta com os poderes espirituais do mal do mundo exterior demanda
uma permanente vigilância de nossa parte para que possamos, pela graça de
Jesus, neutralizar os seus ataques.
“10 Quanto ao
mais, sede fortalecidos no Senhor e na força do seu poder.
11 Revesti-vos
de toda a armadura de Deus, para poderdes ficar firmes contra as ciladas do
diabo;
12 porque a
nossa luta não é contra o sangue e a carne, e sim contra os principados e potestades,
contra os dominadores deste mundo tenebroso, contra as forças
espirituais do mal, nas regiões celestes.
13 Portanto,
tomai toda a armadura de Deus, para que possais resistir no dia mau e, depois
de terdes vencido tudo, permanecer inabaláveis.
14 Estai,
pois, firmes, cingindo-vos com a verdade e vestindo-vos da couraça da
justiça.
15 Calçai os pés com a
preparação do evangelho da paz;
16 embraçando
sempre o escudo da fé, com o qual podereis apagar todos os dardos
inflamados do Maligno.
17 Tomai também o
capacete da salvação e a espada do Espírito, que é a palavra
de Deus;
18 com toda
oração e súplica, orando em todo tempo no Espírito e para isto vigiando
com toda perseverança e súplica por todos os santos”
(Efésios 6.10-18).
É por isso que é muito mais difícil para aqueles que estão em permanente
contato com o mundo, quer em seus locais de trabalho, ou escolas, em shoppings,
etc, manterem permanentemente a paz de mente e espírito, em comunhão plena com
o Senhor, não porque eles não o desejem, mas porque os ataques que receberão do
exterior será para eles uma tentação, que poderão vencer quando receberem
porções adicionais da graça, mas como isto não se encontra no poder deles, senão
na vontade de Deus, como diz o apóstolo Tiago, deverão aprender a lutar e a se
exercitar na fé em clamar ao Senhor para que sejam livrados da possibilidade de
perda da comunhão por serem vencidos pelo mundo.
O Salmista lamenta o fato de ter que habitar em Quedar que não era um
lugar temente a Deus, e Ló afligia a sua alma justa por ter que conviver com os
habitantes de Sodoma e Gomorra.
“5 Ai de mim,
que peregrino em Meseque e habito nas tendas de Quedar.
6 Já há tempo
demais que habito com os que odeiam a paz.” (Salmo 120.5,6).
Tão pernicioso é para a
manutenção da comunhão com Deus o convívio com os ímpios que o Salmo 1 trata
exatamente deste assunto.
“1 Bem-aventurado
o homem que não anda no conselho dos ímpios, não se detém no caminho dos pecadores,
nem se assenta na roda dos escarnecedores.
2 Antes, o
seu prazer está na lei do SENHOR, e na sua lei medita de dia e de noite.
3 Ele é como árvore
plantada junto a corrente de águas, que, no devido tempo, dá o
seu fruto, e cuja folhagem não murcha; e tudo quanto ele faz será bem sucedido.
4 Os ímpios não são assim; são, porém, como a
palha que o vento dispersa.
5 Por isso,
os perversos não prevalecerão no juízo, nem os pecadores, na
congregação dos justos.
6 Pois o SENHOR
conhece o caminho dos justos, mas o caminho dos ímpios perecerá.” (Salmo
1.1-6).
“14 Não vos
ponhais em jugo desigual com os incrédulos; porquanto que
sociedade pode haver entre a justiça e a iniquidade? Ou que comunhão, da luz
com as trevas?
15 Que
harmonia, entre Cristo e o Maligno? Ou que união, do
crente com o incrédulo?
16 Que ligação há entre o
santuário de Deus e os ídolos? Porque nós somos santuário do Deus
vivente, como ele próprio disse: Habitarei e andarei entre eles; serei o seu
Deus, e eles serão o meu povo.” (II Coríntios 6.14-16).
Sobre este perigo de se perder, ainda que temporariamente a comunhão com
Deus, em razão de o crente se associar com os ímpios, Spurgeon faz a seguinte
citação sobre madame Guyon, cuja eminência em santificação é amplamente
conhecida.
“Eu nunca posso entender aquele cristianismo, que
alternativamente sai para encontrar alegria em diversões mundanas, e volta para
casa para ter comunhão com Cristo. Na vida de Madame Guyon, que, embora
professada como papista, deve sempre ser recebida como sendo um verdadeiro
filho de Deus, li uma estória para esse efeito. Ela havia sido convidada por
alguns amigos para passar alguns dias no palácio de St. Cloud. Ela sabia que
era um lugar cheio de pompa e moda, e devo acrescentar, também de vício. Mas,
sendo persuadida por sua amiga e sendo especialmente tentada com a ideia de que
talvez seu exemplo pudesse ser bom, ela aceitou o convite. Sua experiência depois
deve ser um aviso para todos os cristãos. Durante alguns anos aquela santa
mulher andou em comunhão constante com Cristo - talvez ninguém jamais tenha
visto a face do Salvador e beijado Suas feridas mais verdadeiramente do que ela
havia feito. Mas quando ela chegou em casa de St. Cloud, ela encontrou sua
alegria habitual indo embora - ela perdeu seu poder em oração; ela não
conseguia se aproximar de Cristo como deveria ter feito. Ela sentiu em ir ao
amante de sua alma como se ela tivesse jogado a prostituta contra ele. Ela
tinha medo de esperar que ela pudesse ser recebida novamente para o Seu amor
puro e perfeito, e demorou alguns meses até que o equilíbrio de sua paz pudesse
ser restaurado, e seu coração pudesse novamente ser totalmente colocado sobre o
seu Senhor. Aquele que usa uma roupa branca deve se importar onde anda quando
as ruas do mundo são tão imundas quanto são. Aquele que tem mil inimigos deve
cuidar de como se expõe. Aquele que não tem nada na terra para ajudá-lo em
direção ao céu deve tomar cuidado para que ele não vá onde a terra pode ajudar
para o inferno!”
Não é sem motivo que o Senhor nos ordena a vigiar e a orar em todo o
tempo para que não caiamos em tentação, porque não há trégua na guerra
espiritual em que nos encontramos neste mundo.
Mesmo quando não vamos ao encontro do mal, e buscamos manter nossa
comunhão com o Senhor através da oração e meditação da Palavra, de vez em
quando seremos mais ou menos visitados pelo mal que virá a nós sob as mais
diversas formas, ainda que seja por um ataque espiritual direto de Satanás ou dos
demônios.
Se Deus o permitir, certamente será para o exercício da nossa fé, por
buscarmos o socorro e auxílio da graça em Jesus, e aguardarmos em silêncio e
com paciência o momento da libertação.
Estes ataques intempestivos e inesperados são descritos pelo salmista no
Salmo 116, e ali, ele nos revela qual é o modo de agir nestas ocasiões
aflitivas:
“1 Amo o SENHOR,
porque ele ouve a minha voz e as minhas súplicas.
2 Porque
inclinou para mim os seus ouvidos, invocá-lo-ei enquanto eu viver.
3 Laços de
morte me cercaram, e angústias do inferno se apoderaram de mim; caí em
tribulação e tristeza.
4 Então,
invoquei o nome do SENHOR: ó SENHOR, livra-me a alma.
5 Compassivo
e justo é o SENHOR; o nosso Deus é misericordioso.
6 O SENHOR
vela pelos simples; achava-me prostrado, e ele me salvou.
7 Volta,
minha alma, ao teu sossego, pois o SENHOR tem sido generoso para contigo.
8 Pois
livraste da morte a minha alma, das lágrimas, os meus olhos, da
queda, os meus pés.
9 Andarei na
presença do SENHOR, na terra dos viventes.
10 Eu cria,
ainda que disse: estive sobremodo aflito.
11 Eu disse
na minha perturbação: todo homem é
mentiroso.
12 Que darei
ao SENHOR por todos os seus benefícios para comigo?
13 Tomarei o
cálice da salvação e invocarei o nome do SENHOR.
14 Cumprirei
os meus votos ao SENHOR, na presença de todo o seu povo.
15 Preciosa é aos olhos
do SENHOR a morte dos seus santos.
16 SENHOR,
deveras sou teu servo, teu servo, filho da tua serva; quebraste as minhas
cadeias.
17 Oferecer-te-ei
sacrifícios de ações de graças e invocarei o nome do SENHOR.
18 Cumprirei
os meus votos ao SENHOR, na presença de todo o seu povo,
19 nos átrios da
Casa do SENHOR, no meio de ti, ó Jerusalém. Aleluia!” (Salmo 116.1-19).
Ele diz com toda a convicção: “Eu cria, ainda que disse: estive
sobremodo aflito.” Ou seja, a par de toda a fraqueza e aflição de sua alma na
tribulação, ele continuava e continuaria crendo no Senhor e no seu livramento.
Ele invocava o nome do Senhor pois havia decido andar na Sua presença
toda a Sua vida.
Ainda que a mentira dos homens o perturbasse, e ainda que os ataques exteriores
viessem sobre ele, não deixaria de invocar o nome do Senhor, ainda que fosse
entregue por ele à morte, pois sabia que a morte dos santos é preciosa aos
olhos de Deus, pois é por ela que os conduz à Sua presença na glória.
Deus tem sempre compaixão de Seus filhos, especialmente quando estão
sujeitos às aflições, e é atencioso para com as orações que lhes dirigem em
busca de socorro. Ele nunca os deixará ou desamparará.
Por isso o apóstolo Pedro diz que é coisa agradável a Deus que
suportemos injustiças com paciência cristã, confiando que receberemos sempre
dEle a ajuda necessária, quando a buscarmos com fé, por maiores que sejam as
aflições pelas quais possamos estar passando, que culminem até mesmo com o
nosso martírio, como foi o caso com muitos crentes nos dias do apóstolo.
“11 Amados,
exorto-vos, como peregrinos e forasteiros que sois, a vos absterdes das paixões
carnais, que fazem guerra contra a alma,
12 mantendo
exemplar o vosso procedimento no meio dos gentios, para que, naquilo que falam
contra vós outros como de malfeitores, observando-vos em vossas boas obras,
glorifiquem a Deus no dia da visitação.
13 Sujeitai-vos
a toda instituição humana por causa do Senhor, quer seja ao
rei, como soberano,
14 quer às
autoridades, como enviadas por ele, tanto para castigo dos malfeitores como
para louvor dos que praticam o bem.
15 Porque
assim é a vontade de Deus, que, pela prática do bem, façais
emudecer a ignorância dos insensatos;
16 como
livres que sois, não usando, todavia, a liberdade por pretexto da
malícia, mas vivendo como servos de Deus.
17 Tratai
todos com honra, amai os irmãos, temei a Deus, honrai o rei.
18 Servos,
sede submissos, com todo o temor ao vosso Senhor, não somente se for bom e
cordato, mas também ao perverso;
19 porque
isto é grato, que alguém suporte tristezas, sofrendo injustamente,
por motivo de sua consciência para com Deus.
20 Pois que
glória há, se, pecando e sendo esbofeteados por isso, o suportais com paciência? Se,
entretanto, quando praticais o bem, sois igualmente afligidos e o suportais com
paciência, isto é grato a Deus.
21 Porquanto
para isto mesmo fostes chamados, pois que também Cristo
sofreu em vosso lugar, deixando-vos exemplo para seguirdes os seus passos,
22 o qual não cometeu
pecado, nem dolo algum se achou em sua boca;
23 pois ele,
quando ultrajado, não revidava com ultraje; quando maltratado, não fazia
ameaças, mas entregava-se àquele que julga retamente,
24 carregando
ele mesmo em seu corpo, sobre o madeiro, os nossos pecados, para que nós, mortos
para os pecados, vivamos para a justiça; por suas chagas, fostes sarados.” (I
Pedro 2.11-24).
“12 Amados, não
estranheis o fogo ardente que surge no meio de vós, destinado a provar-vos,
como se alguma coisa extraordinária vos estivesse acontecendo;
13 pelo contrário,
alegrai-vos na medida em que sois co-participantes dos sofrimentos de Cristo,
para que também, na revelação de sua glória, vos alegreis
exultando.
14 Se, pelo
nome de Cristo, sois injuriados, bem-aventurados sois, porque sobre vós repousa
o Espírito da glória e de Deus.
15 Não sofra,
porém, nenhum de vós como assassino, ou ladrão, ou
malfeitor, ou como quem se intromete em negócios de outrem;
16 mas, se
sofrer como cristão, não se envergonhe disso;
antes, glorifique a Deus com esse nome.
17 Porque a
ocasião de começar o juízo pela casa de Deus é chegada;
ora, se primeiro vem por nós, qual será o fim
daqueles que não obedecem ao evangelho de Deus?
18 E, se é com
dificuldade que o justo é salvo, onde vai comparecer o ímpio, sim,
o pecador?
19 Por isso,
também os que sofrem segundo a vontade de Deus encomendem a sua alma ao fiel
Criador, na prática do bem.” (I Pedro 4.12-19).
Então, a vida cristã normal, em seu progresso em crescimento espiritual,
sempre incluirá estas provações para a purificação e aumento da fé. Daí nenhum
dos apóstolos apontarem as tribulações como sendo algo estranho à fé, ou por falta
de fé, antes, elas são destinadas ao nosso aperfeiçoamento espiritual, pelo
aprendizado de recorrer a Deus e a confiar e a esperar nele, por maiores que
sejam estas aflições que tanto nos enfraquecem enquanto duram e enquanto Deus não nos fortalece com
suprimentos maiores da graça.
“1 Tiago,
servo de Deus e do Senhor Jesus Cristo, às doze tribos que se encontram na
Dispersão, saudações.
2 Meus irmãos, tende
por motivo de toda alegria o passardes por várias provações,
3 sabendo
que a provação da vossa fé, uma vez confirmada, produz perseverança.
4 Ora, a
perseverança deve ter ação completa, para que sejais perfeitos e íntegros,
em nada deficientes.
5 Se, porém, algum
de vós necessita de sabedoria, peça-a a Deus, que a todos dá liberalmente e
nada lhes impropera; e ser-lhe-á concedida.
6 Peça-a, porém, com fé, em nada
duvidando; pois o que duvida é semelhante à onda do
mar, impelida e agitada pelo vento.
7 Não suponha
esse homem que alcançará do Senhor alguma coisa;
8 homem de ânimo
dobre, inconstante em todos os seus caminhos.
9 O irmão, porém, de
condição humilde glorie-se na sua dignidade,
10 e o rico,
na sua insignificância, porque ele passará como a flor
da erva.
11 Porque o
sol se levanta com seu ardente calor, e a erva seca, e a sua flor cai, e
desaparece a formosura do seu aspecto; assim também se
murchará o rico em seus caminhos.
12 Bem-aventurado
o homem que suporta, com perseverança, a provação; porque,
depois de ter sido aprovado, receberá a coroa da vida, a qual o Senhor prometeu
aos que o amam.” (Tiago 1.1-12).
“3 Bendito o
Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que, segundo a sua muita misericórdia,
nos regenerou para uma viva esperança, mediante a ressurreição de Jesus Cristo
dentre os mortos,
4 para uma
herança incorruptível, sem mácula, imarcescível,
reservada nos céus para vós outros
5 que sois
guardados pelo poder de Deus, mediante a fé, para a salvação
preparada para revelar-se no último tempo.
6 Nisso
exultais, embora, no presente, por breve tempo, se necessário,
sejais contristados por várias provações,
7 para que,
uma vez confirmado o valor da vossa fé, muito mais preciosa do que o ouro
perecível, mesmo apurado por fogo, redunde em louvor, glória e honra na
revelação de Jesus Cristo;
8 a quem, não havendo
visto, amais; no qual, não vendo agora, mas crendo, exultais com
alegria indizível e cheia de glória,
9 obtendo o
fim da vossa fé: a salvação da vossa alma.” (I Pedro 1.3-9).
“1 Justificados,
pois, mediante a fé, temos paz com Deus por meio de nosso Senhor
Jesus Cristo;
2 por intermédio de
quem obtivemos igualmente acesso, pela fé, a esta graça na qual estamos firmes;
e gloriamo-nos na esperança da glória de Deus.
3 E não somente
isto, mas também nos gloriamos nas próprias tribulações,
sabendo que a tribulação produz perseverança;
4 e a
perseverança, experiência; e a experiência, esperança.
5 Ora, a
esperança não confunde, porque o amor de Deus é derramado em nosso coração pelo Espírito
Santo, que nos foi outorgado.” (Romanos 5.1-5).
APÊNDICE:
É somente pelo convencimento e instrução do Espírito Santo que podemos
compreender adequadamente qual seja o significado do pecado.
Sem esta operação do Espírito Santo, ou quando ainda
nos encontramos a caminho de ser melhor esclarecidos por Ele, é muito comum até
mesmo negar-se a existência do pecado, ou classificá-lo das mais variadas
formas possíveis que em pouco ou nada correspondem ao seu verdadeiro e pleno significado.
De modo que quando se diz que Jesus carregou sobre
si os nossos pecados (I Pedro 2.24) e que Ele se manifestou para tirar o
pecado, não é dada a devida importância a este maravilhoso fato, que é a
resposta à única e principal necessidade do ser humano relativa à vida, pois
sem a solução do problema do pecado que a todos atinge, não é possível ter a
vida eterna de Deus.
Então, não se deve pensar em Jesus em alguém que
veio ao mundo para que pudéssemos errar menos, ou ainda que melhorássemos nossas
ações morais, pois a obra de expiação e remoção do pecado está relacionada a
uma questão de vida, caso concluída, ou de morte eterna, em caso contrário.
Então é preciso saber qual é a origem e a natureza
do pecado e a sua forma de agir na humanidade para que o vencendo possamos atingir
ao propósito de Deus na nossa criação e viver de modo agradável a Ele.
Ora, se o pecado é o que se opõe à possibilidade de
se ter vida eterna, então, necessitamos refletir mais cuidadosamente sobre a
relação que há entre pecado e morte, e santidade e vida.
Então, é muito importante que tenhamos uma
compreensão adequada do significado de vida eterna, para que não nos enganemos
quanto a se temos alcançado ou não o propósito de Deus quanto a isto.
Antes de tudo, vida em seu sentido geral é
muito mais do que simples existência, porque os corpos inanimados existem e no
entanto, não possuem vida.
Ainda que alguns seres espirituais existam
eternamente, pois espíritos não podem ser aniquilados, todavia não se pode
dizer deles que possuem vida eterna, e a par da existência consciente deles são
classificados como mortos espiritual e eternamente, tal é o caso de Satanás,
dos demônios e de todos os seres humanos que morreram sob a condenação do
pecado, estando desligados de Deus.
Deus é a fonte e o padrão da verdadeira
vida.
É pelo que existe em sua natureza, portanto,
que se define o que é e o que não é participante da vida eterna.
A vida eterna é perfeita e completa em Deus,
mas nas criaturas (anjos eleitos e santos) que alcançam a participação nesta
vida, estão sujeitos a crescimento na mesma rumo à perfeição divina, que sendo
infinita, será para eles sempre um alvo a ser buscado.
Daí se dizer que quando alguém nasce de novo
do Espírito Santo, que ele é um bebê espiritual em Cristo. Ele deve crescer na
graça e no conhecimento do Senhor, e isto será feito neles pela operação do
Espírito Santo, até contemplar neles a maturidade espiritual que é chamada de
perfeição, mas não sendo ainda aquela perfeição total como ela se encontra
somente em Deus.
Não devemos ficar, portanto, satisfeitos
somente com a conversão inicial a Cristo, pela qual fomos tornados filhos de
Deus e novas criaturas, mas devemos prosseguir em busca daquela santificação
que nos tornará cada vez mais à imagem e semelhança de Jesus.
O grande indicador do progresso neste
crescimento na vida eterna, é o de aumento de graus em santificação. Este
aperfeiçoamento em santificação é a vontade de Deus quanto ao seu propósito em
nos ter tornado seus filhos. (I Tessalonicenses 4.3,
5.23).
Esta é a vida em abundância que Jesus veio dar àqueles que se tornariam
filhos de Deus por meio da fé nele.
Podemos entender melhor isto quando fazemos um contraste com o pecado,
pois se o pecado é o que produz morte, a santidade é o que produz vida.
Concluímos que somente aqueles que forem santificados têm acesso à vida
eterna. Daí se dizer que sem santificação ninguém verá o Senhor.
É fácil entendermos esta verdade quando refletimos que de fato não se
pode dizer que há a vida de Deus onde domina o orgulho, a impureza, a malícia,
a cobiça, o adultério, o ódio, o roubo, a corrupção, a inveja, e todas as obras
da carne que operam segundo o pecado.
Mas, onde o que prevalece é a fé, a humildade, o amor, a bondade, a
misericórdia, a longanimidade, a reverência, o louvor, a adoração ao Senhor, a
obediência aos Seus mandamentos e tudo o mais que compõe o fruto do Espírito
Santo, pode-se dizer que temos em tudo isto indícios ou evidências onde há vida
eterna.
Os que afirmam andar na luz e pertencerem a Jesus, quando na verdade
caminham nas trevas, são chamados pelo apóstolo João de mentirosos, e que não
têm de fato a vida eterna que eles alegam possuir, porque onde ela foi semeada
por Jesus, não produz os frutos venenosos do pecado e da justiça própria, senão
os que são provenientes da santidade e da justiça de Jesus atuando em nós.
Como o conhecimento verdadeiro de Deus, consiste em termos um
conhecimento pessoal de Seu caráter, virtude, obras e atributos, e isto, por
uma revelação que recebamos da parte dEle em Espírito, e para tanto temos
recebido o dom da fé, então, não somos apenas justificados por este
conhecimento, como também acessamos à vida eterna, alcançando que sejam
implantadas em nós as mesmas virtudes e caráter de Cristo.
É este conhecimento real, espiritual e pessoal de
quem seja de fato Deus, o que promove a nossa santificação e aumentos em graus
na posse da vida eterna, ou melhor dizendo, para que a vida eterna se aposse em
maiores graus de nós.
Quando nos falta este viver piedoso na verdade, ainda que sejamos
crentes, Deus nos vê como mortos e não como vivos, e por isso somos chamados ao
arrependimento e à prática das primeiras obras, para que tenhamos o necessário
reavivamento espiritual. (Apocalipse 3.1-3,17-19).
Enganam-se todos aqueles que por julgarem estarem cheios de energia, e
envolvidos na realização de muitas obras, que isto é um sinal evidente de vida
abundante neles, quando toda esta energia é carnal e não acompanhada por um
viver realmente piedoso que seja operado neles pelo Espírito Santo, pela
aplicação da Palavra de Deus às suas vidas.
É na medida em que as obras da carne são mortificadas que mais se
manifesta em nós a vida eterna que há em Cristo.
Se não houver a crucificação do ego carnal, a mortificação do pecado, a
vida ressurreta de Cristo não se manifestará.
A verdadeira santidade que conduz à vida é dependente das operações
sobrenaturais do Espírito Santo, mediante a obra realizada por Jesus Cristo em
nosso favor. A mera prática da moralidade não pode produzir esta santidade necessária
à vida eterna. A simples religiosidade carnal na busca de cumprimento dos
mandamentos de Deus, segundo a nossa própria justiça, também não pode produzir
esta santidade. O jovem rico enganou-se quanto a isto, e por não se sujeitar à
justiça que vem de Cristo, não alcançou a vida eterna.
Há necessidade de convencimento do pecado pelo Espírito Santo, de que
Ele nos convença de nossa completa miserabilidade diante de Deus, e de nossa
total dependência da sua misericórdia, graça e bondade, para que nos salve,
mediante a confiança que temos colocado em Jesus e na obra que Ele realizou em
nosso favor. Sem isto, não pode haver salvação, e por conseguinte vida eterna,
porque Deus não pode operar santidade em um coração que se rebela contra Ele e
Sua vontade.
Deus não contempla nossos meros desejos e palavras. Ele olha o nosso
coração. Ele opera somente segundo a verdade, e não segundo nossas emoções,
sentimentos, vontades, pois podem não estar conformados à verdade da Sua
Palavra revelada na Bíblia, e assim não podendo chegar a um verdadeiro
arrependimento, torna-se impossível sermos contemplados com uma salvação cujo
fim é a nossa santificação.
Para o nosso presente propósito, não basta ir ao
relato de como o pecado entrou no mundo através do primeiro casal criado,
atendo-nos apenas aos fatos relacionados à narrativa da Queda, sobretudo quanto
à maneira desta entrada mediante tentação vindo do exterior da parte de Satanás
sobre a mulher. É preciso entender o mecanismo de operação desta tentação
naquela ocasião, uma vez que ela ocorreu quando a mulher era inocente, não
conhecia nem bem e nem mal, não sendo portanto ainda uma pecadora, e no
entanto, pela tentação, teve o desejo de praticar algo que lhe havia sido
proibido por Deus.
Poderia este desejo, sem a consumação do ato, ser
considerado como sendo a própria entrada do pecado? Em caso contrário, o que
seria necessário haver também para que assim fosse considerado?
Por que desde aquele primeiro pecado, toda a
descendência de Adão ficou encerrada no pecado? Por que o pecado permanece
ligado à natureza dos próprios crentes, mesmo depois da conversão deles?
Por que o pecado desagrada tanto a Deus que como
consequência produz a morte?
Estas e outras perguntas, procuraremos responder nas
linhas a seguir.
Antes de apresentar qualquer consideração específica
ao caso, é importante destacar que o único ser que possui vontade absoluta,
gerada em si mesmo, e sempre perfeita e aprovada, é Deus, cuja vontade é o
modelo de toda vontade também aprovada. Esta é a razão de Ele não poder ser
tentado ao mal, e a ninguém tentar. Sua vontade é santíssima e perfeitamente
justa. Mas no caso dos homens e até mesmo dos anjos, cuja vontade é a de uma
criatura, sendo dotados de vontade livre, estão contingenciados a submeterem
suas vontades à de Deus naqueles pontos em que o exercício da própria vontade
deles colidisse com esta vontade divina. Eles são livres para pensar, imaginar,
agir, criar, mas tudo dentro de uma esfera que não ultrapasse os limites que lhes
são determinados por Deus, quer na lei natural impressa em suas consciências,
quer na lei moral revelada em Sua Palavra, a qual é também impressa nas mentes
e corações dos crentes.
Temos assim, desde o início da criação, um campo
aberto para um possível conflito de vontades. Deus por um lado agindo pelo
Espírito Santo buscando nos mover à negação do ego para fazer não a nossa, mas
a Sua vontade, e o nosso ego querendo fazer algo que possa ser eventualmente
diferente daquilo que Deus determina para que façamos ou deixemos de fazer.
Neste ponto, podemos entender que a proposta de
Satanás para Eva no paraíso, buscava estimular e despertar desejos e
sentimentos em Eva para que a sua vontade fosse conduzida pela do diabo, e não
pela de Deus.
Se ao sentir-se inclinada à desobediência ela
tivesse recorrido à graça divina, clamando por ajuda para rejeitar a tentação e
permanecer obediente, a fé teria triunfado em sua confiança no Senhor e
sujeição a ele, e em vez de um ato pecaminoso, haveria um motivo para Deus ser
glorificado. E isto ocorreria todas as vezes em que ao ser tentado a fazer algo
diferente do que havia sido determinado por Deus, o homem escolhesse obedecer à
Sua Palavra, e não aos desejos criados em seus pensamentos e imaginação.
Podemos tirar assim a primeira grande conclusão em
ralação ao que seja o pecado, de que não se trata de algo corpóreo, ainda que
invisível, com existência própria e poder inteligente para nos influenciar, mas
é algo decorrente de nossas próprias inclinações, desejos e más escolhas,
especialmente quando não nos permitimos ser dirigidos e instruídos por Deus, e
não nos exercitamos em sujeitar todas as nossas faculdades a Ele para agir
conforme a Sua santa, boa, perfeita e agradável vontade.
É pelo desconhecimento desta verdade que muitos
crentes caminham de forma desordenada, uma vez que tendo aprendido que a
aliança da graça foi feita entre Deus Pai e Deus Filho, e que são salvos
exclusivamente por meio da fé, que então não importa como vivam uma vez que já
se encontram salvos das consequências mortais do pecado.
Ainda que isto seja verdadeiro, é apenas uma das
faces da moeda da salvação, que nos trazendo justificação e regeneração
instantaneamente pela graça, mediante a fé, no momento mesmo da nossa conversão
inicial, todavia, possui uma outra face que é a relativa ao propósito da nossa
justificação e regeneração, a saber, para sermos santificados pelo Espírito
Santo, mediante implantação da Palavra em nosso caráter. Isto tem a ver com a
mortificação diária do pecado, e o despojamento do velho homem, por um andar no
Espírito, pois de outra forma, não é possível que Deus seja glorificado através
de nós e por nós. Não há vida cristã vitoriosa sem santificação, uma vez que
Cristo nos foi dado para o propósito mesmo de se vencer o pecado, por meio de
um viver santificado.
O homem, tendo sido
criado em um estado tão santo e glorioso, foi colocado no Paraíso, que era sua residência.
No meio deste Jardim
do Éden estava a árvore da vida,
que não consideramos pertencer a uma certa espécie, mas
era uma árvore singular na natureza. “E
do chão fez o Senhor Deus crescer todas as árvores
... a árvore da vida também no meio do jardim ”(Gênesis 2:
9). Portanto, essa árvore não
foi encontrada em outros locais.
No Paraíso, havia também
a árvore do conhecimento do bem e do mal.
“Mas da árvore do conhecimento
do bem e do mal, dela não comerás”
(Gn 2:17; 3: 3). Como lá havia
apenas uma árvore da vida; portanto, havia apenas uma árvore do conhecimento do
bem e do mal. Não
se afirma que isto se refere ao tipo de árvore, mas ao número. É simplesmente referido como "a árvore".
A razão para esse nome pode ser deduzido do próprio nome.
(1) Era uma árvore
probatória pela qual Deus desejava provar ao homem se ele perseveraria em fazer
o bem ou se ele cairia no mal, como se encontra em 2 Crônicas 32:31: “... Deus
o deixou, para julgá-lo, para que ele pudesse saber tudo que estava em seu
coração."
(2) O homem, ao comer
desta árvore, saberia em que condição pecaminosa e triste ele tinha trazido a
si mesmo.
O Senhor colocou Adão
e Eva neste jardim para cultivá-lo e
guardá-lo (Gn 2:15).
O sábado era a exceção, pois então
ele era obrigado a descansar e a se abster de trabalhar de acordo com o exemplo
que seu Criador lhe dera e ordenara que ele imitasse.
Assim, Adão tinha
todas as coisas em perfeição e para deleite do corpo e da alma. Se ele tivesse perseverado perfeitamente durante seu
período de estágio, ele, sem ver nenhuma morte, teria sido conduzido ao terceiro
céu, para a glória eterna. Embora
o corpo tivesse sido construído a partir de
elementos materiais, sua condição era tal que era
capaz de estar em união essencial com a alma imortal e capaz de existir sem
nunca estar sujeito a doença ou morte.
Se ele não tivesse
pecado, o homem não teria morrido, mas teria subido ao
céu com corpo e alma. Isso pode ser facilmente
deduzido do fato de que Enoque, mesmo depois da entrada do pecado no mundo, foi
arrebatado ao terceiro céu, sem passar pela morte, em razão de ter andado com
Deus.
Sendo este o desígnio de Deus na criação do homem, a saber, que ele
andasse em santidade de vida na Sua presença, então não é difícil concluir quão
enganados se encontram aqueles que apesar de terem muita prosperidade material
e facilidades no mundo, e que todavia não estão santificados pela Palavra de
Deus, aplicada pelo Espírito Santo, em razão da fé em Jesus, e que os tais
encontram-se mortos à vista de Deus em delitos e pecados, permanecendo debaixo
de uma maldição e condenação eternas, enquanto permanecerem na citada condição
sem arrependimento e conversão.
Aqui percebemos a
natureza abominável do pecado, enquanto o homem, sendo
dotado de faculdades tão excelentes para estar unido ao Seu
Criador com tantos laços de amor, partiu dEle, e O desprezou e O rejeitou.
Ele agiu para que o
Criador não o dominasse, mas que pudesse ser seu próprio senhor e viver de
acordo com a sua própria vontade.
Aqui brilha a
incompreensível bondade e sabedoria de Deus, na medida em que reconcilia tais
seres humanos maus consigo mesmo novamente através do Mediador Jesus Cristo. Ele fez com que este mediador viesse de Adão como
santo, tendo a mesma natureza que pecara, para suportar a punição do pecado do
próprio homem e, assim, cumprir toda a justiça. Tais
seres humanos, Ele novamente adota como Seus filhos e toma para Si em felicidade
eterna. A Ele seja dado
eterno louvor e honra por isso. Amém.
Eva foi seduzida a
comer da árvore do conhecimento do bem e do mal. Ela
não foi coagida, mas o fez por vontade própria.
Além
disso, Adão não foi o primeiro a ser enganado, nem foi enganado pela serpente,
mas como o apóstolo declara em 1 Tim 2:14, por uma Eva enganada - e, portanto,
subsequente a ela. Estou convencido de
que, se Adão permanecesse de pé, Eva teria suportado
o castigo sozinha. Como Adão
também pecou, no entanto, toda a
natureza humana, toda a raça humana, tornou-se
culpada, como Paulo disse: "Portanto, como por um homem o pecado entrou no
mundo ..." (Romanos 5:12). Ele
não apenas se refere ao pecado de Eva, mas ao pecado
de toda a raça humana, que é total e inteiramente encerrada em Adão e Eva, que
eram um em virtude de seu casamento. Em
vez disso, ele se refere especificamente ao pecado de Adão,
que foi o primeiro homem, a primeira e única fonte, tanto de Eva como de toda a
raça humana.
Entenda-se este ato
de ter sido encerrado por Deus no pecado, não como se Deus tivesse feito a cada
um de nós pecadores, ou então que tivesse transferido para nós o pecado
praticado por Adão, mas como a consideração e imputação de culpa a toda a
humanidade, e sujeição à maldição da condenação pela morte, uma vez que não
haveria quem não pecasse, já que o homem revelou desde Adão que de um modo ou
de outro faria um uso indevido de sua vontade, opondo-se a Deus. Pois sem a
concessão da Graça de Deus é impossível que o homem possa vencer o pecado. E a
Graça para tal propósito somente é concedida aos que creem em Jesus.
O pecado inicial não
pode ser encontrado no ato externo, nas emoções, afetos e inclinações, nem na
vontade. Em uma natureza
perfeita, vontade e emoções estão sujeitos ao
intelecto, pois não precedem o intelecto em sua função, mas são uma consequência
do mesmo.
O pecado inicial deve ser buscado no intelecto, que por meio de
raciocínio enganoso foi levado a concluir que eles não morreriam e que havia um
poder inerente àquela árvore para torná-los sábios, uma sabedoria que eles
poderiam desejar sem serem culpados de pecado. Essa
árvore tinha o nome de conhecimento,
que era desejável para eles. Mas
também trazia o nome de bem e mal,
mesmo que estivesse escondido deles quanto ao que era compreendido na palavra mal. A serpente usa esse nome como se grandes questões
estivessem ocultas nessas palavras. Como
o intelecto se concentrou mais na conveniência de se tornar sábio quanto a
árvore pela qual, como meio ou causa, essa sabedoria poderia ser transmitida a
eles, a intensa e viva consciência da proibição de não comer e da ameaça de
morte tendem a diminuir. A faculdade de
julgamento, sugerindo que seria desejável comer dessa árvore, despertou a
inclinação de adquirir sabedoria dessa maneira. Além
disso, havia o fato de que “... a mulher viu que a
árvore era boa para comer, e agradável aos olhos” (Gn
3: 6).
A decepção do
intelecto não foi consequência da natureza da árvore e de seus frutos, mas
devido às palavras da serpente e as palavras da mulher para Adão. Assim, foi tomada por verdadeira a palavra da
serpente, e depois a da mulher, em vez da Palavra de Deus. Portanto, o primeiro pecado foi a fé na serpente,
(ainda que não no animal propriamente dito, mas naquele que o usou como seu
instrumento, a saber, Satanás.), acreditando que eles não
morreriam, mas, em vez disso, adquiririam sabedoria.
O ato implicava uma
descrença em Deus que havia ameaçado a morte ao comer dessa árvore. Assim Eva em virtude da incredulidade tornou-se
desobediente, estendeu a mão e comeu. Ao
fazer isso, ela creu na serpente e foi enganada, este pecado é denominado como tal em 1 Tim 2:14 e
2 Cor 11: 3.
Da mesma maneira, ela
seduziu Adão. Portanto, o primeiro
pecado não era orgulho, isto é, ser igual a Deus, também não rebelião,
desobediência ou apetite injustificado, mas incredulidade.
Não crer na palavra
de Deus, não dar a devida observância a ela e não praticá-la, é tudo
consequente de incredulidade, e este é o pecado principal do qual os demais se
originam, pois o justo viverá por sua fé, e por esta fé é possível até mesmo
confessar-se culpado, arrepender-se e converter-se a Deus, e tudo isto sucede
por conta de se dar crédito às ameaças de Deus contra o pecado.
Concluímos, que o
pecado sempre jaz à porta, ele sempre nos assedia bem de perto, conforme
afirmam as Escrituras, pois o intelecto sempre é solicitado de uma forma ou de
outra, por tentações internas ou externas, a despertar a vontade e desejos
pecaminosos, que se não forem resistidos por meio da graça, sempre
prevalecerão.
Daí nos ser ordenado
a vigiar e orar incessantemente, porque a carne é fraca. A andarmos
continuamente no Espírito Santo para podermos vencer as obras da carne, e não
ceder às tentações.
É por meio de uma
vida santificada que nos tornamos fortes para resistir ao pecado, pois
eliminá-lo de uma vez por todas enquanto andamos neste mundo, equivaleria a
remover de nós toda a liberdade que temos de escolher livremente o que fazer e
o que não fazer. De modo que se não nos negarmos, se não sujeitarmos a nossa
vontade à de Deus, seguindo o exemplo de nosso Senhor Jesus Cristo, jamais
poderemos ter um caminhar vitorioso neste mundo.
Quando nosso Senhor foi conduzido ao deserto para ser tentado pelo
diabo, Ele foi solicitado a transformar pedras em pães porque era grande a sua
fome no final do jejum de quarenta dias e noites. O diabo vislumbrou nEle este
desejo por comida, e então reforçou o desejo por meio de tentação dizendo-lhe
que se era de fato o Filho de Deus, poderia transformar pedras em pães. Se Ele
o fizesse, teria pecado porque estava sob o comando total do Espírito Santo e
somente poderia fazer o que lhe fosse ordenado pelo Pai. Nada poderia fazer por
seu próprio poder, ao qual deveria renunciar em seu ministério terreno, para
ser obediente não como Deus, mas como homem, segundo a instrução do Espírito
Santo. O desejo de comer não era em si pecaminoso, mas a ordem era que somente
quebrasse o jejum quando lhe fosse permitido pelo Pai. Assim, Jesus renunciou
ao desejo, porque nem só de pão material vive o homem, mas de toda palavra que
procede da boca de Deus. O desejo não foi consumado e portanto não houve
pecado, mas uma obediência pela qual Deus foi glorificado.
O mesmo sucede conosco sempre que somos solicitados pelo nosso intelecto
a fazer o que nos seja vedado pela Palavra de Deus. Se renunciarmos à nossa
própria vontade para fazer a do Senhor, então somos aprovados e nisto Ele é
glorificado.
Assim, qualquer tentação específica traz em si mesma o potencial para a
nossa ruína, ou para a glória de Deus, em caso de desobediência ou obediência,
respectivamente.
“Se alguém vem a mim e não aborrece
a seu pai, e mãe, e mulher, e filhos, e irmãos, e irmãs e ainda
a sua própria vida, não pode ser meu discípulo. E
qualquer que não tomar a sua cruz e vier após mim não pode ser
meu discípulo.” (Lucas 14.26,27).
A cruz representa o ato de sacrificarmos a nossa própria vontade para
escolher fazer a de Deus.
“Assim, pois, todo aquele que dentre vós não renuncia
a tudo quanto tem não pode ser meu discípulo.” (Lucas 14.33)
O fato de que Deus
desde a eternidade conheceu a queda, decretando que permitiria que ocorresse,
não é apenas confirmado pelas doutrinas de sua onisciência e decretos, mas
também pelo fato de que Deus desde a eternidade tem ordenado um Redentor para o
homem, para libertá-lo do pecado: o Senhor Jesus Cristo, a quem Pedro chama de
Cordeiro, “que em verdade foi predestinado antes da fundação do mundo” (1 Pedro
1:20).
O pecado causa a
morte eterna mas o seu efeito pode ser revertido por meio da fé em Jesus
Cristo. A Lei de Deus que opera segundo a Sua justiça, é implacável e amaldiçoa
a todo aquele que vier a transgredir a qualquer dos seus mandamentos. Mas o
amor, a misericórdia, a longanimidade e bondade de Deus dão ao pecador a
oportunidade de se voltar para Ele, através do arrependimento e da fé, pois o
próprio Deus proveu uma aliança com o Filho, através da qual pode adotar
pecadores como filhos amados, para serem tornados santos por Ele, prometendo-lhes
conduzi-los à perfeição total quando eles partirem para a glória celestial,
assim como havia feito nos próprios dias do Velho Testamento, dando inclusive
um novo corpo perfeito e glorificado a Enoque e a Elias. Mas todos os espíritos
dos que nEle creram foram transladados em perfeição para o mesmo céu de glória.
Deus nos ensina,
quando nele cremos, que a sua graça é suficiente e poderosa para nos firmar em
santidade, pois na nossa própria experiência conhecemos que quanto mais nos
consagramos a Ele, mais somos fortalecidos pela graça para resistir e vencer o
pecado, inclusive o que procura se levantar em nossa própria natureza terrena.
Por isso temos recebido em Cristo uma nova natureza, ao lado da antiga, para
subjugar esta última, pois a nova natureza é celestial, espiritual, divina e
santa, e sempre nos inclina para aquilo que é de Deus e que é conforme a Sua
santa vontade.
É por uma caminhada
constante no Espírito Santo, mediante a prática da Palavra, que somos tornados
cada vez mais espirituais e menos inclinados para a carne que não é sujeita à
lei de Deus e nem mesmo pode ser.
Mas é de tal ordem a
bondade e misericórdia que Deus nos tem concedido por meio da aliança da graça
em Cristo, que mesmo aqueles que não tenham feito grande progresso em
santificação têm a condenação eterna anulada por causa da união deles com
Jesus, por meio de quem receberam um novo nascimento espiritual para
pertencerem a Ele. Não serão jamais lançados fora conforme a Sua promessa,
porque isto seria a negação da verdade de que foram de fato salvos por pura
graça e não por mérito, virtude ou obras deles mesmos.
Deus nos trata conforme a cabeça da raça sob a qual
nos encontramos: se apenas em Adão, estamos condenados pela sentença que foi
lavrada sobre ele e todos aqueles que viriam a ser da sua descendência; mas se
estamos sob a cabeça de Cristo, recebemos um novo nascimento e somos ligados
espiritualmente a Ele, e não somos apenas livrados da sentença que tínhamos sob
Adão, pois somos considerados por Deus como tendo morrido juntamente com
Cristo, como também somos conduzidos à vida eterna, pelo poder da justificação
e da ressurreição, que o próprio Cristo experimentou, para que fosse também
comunicado aos que estão unidos a Ele pela fé.
Todos os homens,
tendo pecado em Adão, são roubados da imagem
de Deus, então todo homem nasce vazio de luz espiritual, amor,
verdade, vida e santidade.
Então ao se analisar
o que seja o pecado não se deve simplesmente pensar nas ações pecaminosas que
são resultantes do princípio que opera na natureza caída, mas nas consequências
de estarmos sem Cristo, e por conseguinte destituídos da graça de Deus.
Pois ainda que alguém
que não pertença a Cristo, estivesse isolado em um lugar ermo, e sem
pensamentos pecaminosos ou possibilidade de ser tentado a pecar, ainda assim,
esta pessoa estaria morta espiritualmente, em completa ignorância de Deus e da
Sua vontade santa, sem a possibilidade de ter comunhão com Ele, e portanto ter
paz, alegria e vida espiritual e participação em todas as virtudes de Cristo,
pois é esta a condição do homem natural sem Cristo.
Pela entrada do
pecado no mundo, em razão da incredulidade, é somente por meio da fé que Deus
pode se manifestar e habitar no interior do homem.
A justiça de Deus
exige que todo aquele que se aproxima dele para ter comunhão com ele, seja
também justo. E como poderia o pecador, destituído totalmente da justiça divina
se aproximar dEle, senão por meio dAquele que foi dado por Deus a ele para tal
aproximação por meio da fé?
A imagem de Deus é restaurada na regeneração. Tudo o que foi restaurado foi uma vez perdido, e o
que quer que seja dado não estava em posse anteriormente. “E vos revestistes do novo homem que se refaz
para o pleno conhecimento, segundo a imagem daquele que o criou;”
(Cl 3:10); “no sentido de que, quanto
ao trato passado, vos despojeis do velho homem, que se corrompe segundo as
concupiscências do engano, e vos renoveis no espírito do
vosso entendimento, e vos revistais do novo homem, criado segundo Deus, em
justiça e retidão procedentes da verdade.”
(Ef 4: 22-24).
Ao nos dar Cristo,
Deus resolve o problema do pecado pela raiz, porque não trata conosco no varejo
de nossas transgressões, mas destrói a fábrica de veneno para que dali não
saiam mais produtos venenosos, pois a corrupção herdada também consiste em uma propensão ao pecado.
O pecado original não consiste apenas na ausência da justiça original, mas também na posse de uma propensão ao
contrário à justiça. A falta de ação da graça divina no
coração do pecador é o que faz com que seja avesso à vontade de Deus, e busque
seguir a sua própria vontade. É a graça somente quem pode transformar o nosso
coração de pedra insensível a Deus, por um coração de carne sensível a Ele.
Então, pela própria
entrada do pecado no mundo, podemos ser ensinados por Deus que não podemos
viver de modo agradável a Ele se não nos submetermos inteiramente a Cristo,
para que possamos receber graça sobre graça, que é a única maneira de sermos
mantidos firmes na fé e em santidade na Sua presença.
De modo que o maior pecado que uma pessoa pode cometer além da sua
condição natural pecaminosa é o de rejeitar a graça que lhe está sendo
oferecida em Cristo para ser curada do pecado e de suas consequências, e a
principal delas que é a morte espiritual e eterna.
O pecado e a morte que é
consequente dele devem ser combatidos com a vida de Jesus, e é em razão disso
que Ele sempre destacou em seu ministério terreno que a principal coisa que
temos a fazer é crer nEle, e disso os apóstolos e todos nós fomos encarregados
para dar testemunho desta verdade.
Não podemos considerar devidamente o pecado à parte de Jesus, pois Ele
não se manifestou apenas para que deixássemos de fazer o que é errado para
fazer o que é certo, mas para que tivéssemos vida em abundância e santa, para
que pudéssemos estar em comunhão com Deus, sendo coparticipantes da Sua
natureza divina, condição esta que foi perdida por Adão, e por ele, toda a sua
descendência.
Muitas outras considerações podem
ser feitas sobre o que seja o pecado e o modo como ele opera, e também o modo
como podemos alcançar a vitória sobre o pecado por meio da fé, mas entendemos
que as considerações que foram apresentadas são suficientes para o objetivo de
conhecermos melhor este inimigo, que não sendo vencido pode interromper a nossa
comunhão com Deus ou até mesmo impedir que alcancemos a vida eterna, pela
incredulidade em Cristo.
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